O Sal da terra entre Cila e Caríbdis
“Vós
sois Sal da terra”, disse Jesus aos seus discípulos. O sal serve para preservar
produtos. Um bom exemplo aqui no Nordeste é o “charque”, que é uma carne
salgada e seca. Antigamente, os produtores de
carne bovina eram os estados de Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba. Os
mercados consumidores eram Pernambuco e Bahia. Então, os produtores deviam transportar
o gado para Pernambuco e Bahia. Porém o rebanho sofria muito durante o
transporte; o resultado foi uma desvalorização do rebanho durante o transporte
para abate nos mercados consumidores; então, os produtores começaram a abater
os animais e conservar a carne em sal. Gado e sal foram os negócios que
renderam muito lucro para suas capitanias produtoras.
O
sal serve também para dar sabor aos produtos. Pão sem sal não tem muito sabor,
e um churrasco de carne que não foi salgada, não é um sucesso! O sal deve sair
do saleiro para dar sabor a carne. Essa é uma das aulas de Jesus aqui para seus
discípulos. O sal serve para dar sabor a carne; os discípulos de Jesus servem
para dar sabor a terra! “Vós sois Sal da Terra!”
Isso
quer dizer que o cristão deve fazer um contato com o mundo em redor dele para
ter um efeito.
O
sal deve ser colocado na carne para que possa salgar a carne e dar sabor! O
cristão não pode se isolar neste mundo, porque assim não consegue cumprir o
mandato de Cristo, que disse: “Vos sois Sal da Terra!”
Existe
um problema aqui, porque Jesus também avisa seus discípulos, dizendo que o sal
pode se tornar “insípido”. O sal pode perder o sabor! E “como lhe restaurar o
sabor? Para nada mais presta senão para, lançado fora, ser pisado pelos homens!”.
Então,
como servir bem como “Sal da Terra” e como não perder o sabor? Muitas igrejas
cristãs lutaram com esse problema. Elas queriam funcionar na sociedade como
“Sal da Terra”, mas descobriram que o “Sal” pode perder o sabor. Isso acontece
quando o poder do mundo é mais forte e deixa o “sal” insípido! Este processo se
chama “assimilação”. A igreja abre as janelas e as portas para evangelizar; ela
chama as pessoas para seguir Jesus Cristo e, fazendo isso, ela faz compromissos
para atrair as pessoas do mundo; pessoas estão interessadas, mas não conseguem
se livrar de certos costumes que aprenderam no mundo; e assim o cheiro do mundo
entrará devagarinho na igreja e afetará a vida dela. A igreja se adapta ao
mundo em redor dela. Isso se chama “assimilação”: as duas sociedades diferentes
se tornam semelhantes ou idênticas!
Certas
igrejas observam isso e querem se proteger contra isso. Elas acham que devem se
isolar do mundo. Em vez de abrir as janelas e as portas, elas as fecham para o
mundo. Elas vivem isoladamente e os membros não tem muito contato com as
pessoas do mundo.
A
igreja dos Coríntios vivia assim, seguindo os conselhos do Apóstolo Paulo, que
tinha dito “não vos associásseis com os
impuros!”. Então eles se afastaram das pessoas do mundo e começaram a se
isolar.
Paulo,
observando isso, escreveu uma carta em que disse: “Já em carta vos escrevi que não vos associásseis com os impuros;
refiro-me, com isto, não propriamente aos impuros deste mundo, ou aos avarentos,
ou roubadores, ou idólatras; pois, neste caso, teríeis de sair do mundo!”. E
isso é impossível.
Não
podemos sair deste mundo.
Existem
pessoas que tentaram isso. Eles se afastaram da sociedade em que viviam e foram
para lugares desertos ou afastados para viver lá. Como, por exemplo, os
eremitas. São pessoas religiosas que não vivem em comunidade, mas uma ermida,
solitária, dedicando-se apenas à oração e à penitencia; nos primeiros séculos,
muitos eremitas foram viver nos desertos de África, para se santificarem.
E
existem também grupos de pessoas que fazem isso. Os Amish nos Estados Unidos e
no Canadá são comunidades isoladas, que se isolam e ficam afastadas do mundo. Certas
igrejas reformadas vivem, também, assim. Elas até defendem isso dizendo: a nossa
força está no isolamento. Elas se isolam e o crescimento da igreja está
baseado, principalmente, no alto número de crianças que nascem. O número de
pessoas convertidas que vieram do mundo é baixíssimo. Essas comunidades são fechadas
e existe um abismo cultural entre essas comunidades cristãs e o mundo fora.
Posso
entender essa posição isolada, porque cresci numa sociedade que era assim. Uma
comunidade bem fechada, mas ela sustentava generosamente a obra missionária em
outras partes do mundo, especialmente na Papua Nova Guiné. Hoje, sou
missionário e me pergunto: é isso que Cristo queria dizer, quando ele disse:
“Vós sois o Sal da Terra!”?
Acredito
que não! A igreja cristã não é do mundo, mas vive, sim, dentro do mundo! Ela
deve salgar o mundo; ela deve penetrar o mundo; ela deve fazer uma diferença no
mundo; deve se destacar no mundo. O amor de Deus e o exemplo de Cristo devem
inspirá-la e transformar a vida dela e o seu contexto. Isso não
é fácil. Reconheço a tensão entre os polos opostos: Isolamento OU Assimilação.
São dois perigos, como a Cila e Caríbdis. A Cila e a Caríbdis foram dois
monstros, na mitologia grega, que viviam entre Itália e Sicília. Quem devia
passar por essa passagem devia evitar tanto um, como o outro. Foram dois
perigos. Daí o provérbio: “Sair de Caríbdis,
cair em Cila”, ou mais comumente: “Andar entre Cila e Caríbdis”.
O
desafio cristão é esse: evitar por um lado o isolamento e por outro lado a
assimilação. Quem é fraco, ele se perderá em um dos dois. Ou se esconderá no
isolamento e funciona como o sal no saleiro, que não tem efeito nenhum; OU se
perderá na assimilação e se tornará insípido. Ambas as opções não combinam com
a nossa missão: Ser Sal da Terra! Cristo conseguiu fazer isso. Na próxima vez
darei um exemplo disso.
Comentários
Postar um comentário