O Sal da Terra e a Lei de Moisés


O Sal da Terra e a Lei de Moisés

“O sal deve arder” disse Lutero uma vez. E com isso ele queria dizer que devemos aplicar o sal rigorosamente. O sal deve ser puro, para arder. Porque se o sal ficar insípido, não funcionará bem e não servirá para nada. Em uma das postagens anteriores já disse que podemos considerar Jesus como O Sal da terra. Por excelência! Um bom exemplo disso é a história da mulher adúltera que encontramos em João 8!
                Acredito que todo mundo conheça bem essa história. Jesus estava ensinando no templo e num certo momento houve um tumulto: um grupo de homens estava se aproximando, e levaram consigo uma mulher que foi pega em flagrante. Um caso de adultério. De acordo com a lei de Moisés, ela devia ser condenada e apedrejada. Ela e o parceiro. Ele não estava lá, mas ela, sim.
Os Fariseus, que podem ser considerados como os guardas da lei, não aplicaram a pena da morte logo, mas decidiram se aproveitar dessa situação e levar o caso para Jesus com a intenção de testá-lo. Eles queriam ver se ele ia concordar com a lei de Moisés neste ponto, porque já várias vezes ele demonstrou uma posição diferente a respeito da lei de Moisés. Os discípulos dele colheram espigas no dia do sábado (Mt 12), ele curou um homem no dia do sábado e assim violava o sábado; os discípulos dele não seguiam a tradição dos antigos a respeito da pureza (Mt 16); então, parece que Jesus não seguia rigorosamente a lei de Moisés.
Por causa disso eles fizeram essa pergunta: “Mestre, esta mulher foi apanhada em flagrante adultério. E na lei nos mandou Moisés que tais mulheres sejam apedrejadas; tu, pois, que dizes?
                Nós sabemos que Jesus, a respeito da lei de Moisés, já falou no sermão do monte (Mt 5-7), e naquela ocasião ele tinha dito: Não penseis que vim revogar a lei ou os Profetas; não vim para revogar; vim para cumprir. Porque em verdade vos digo: até que o céu e a terra passem, nem um i ou um til passará da lei, até que tudo se cumpra. Aquele, pois, que violar um destes mandamentos, posto que dos menores, e assim ensinar aos homens será considerado mínimo no reino dos céus; aquele, porém, que os observar e ensinar, esse será considerado grande no reino dos céus. Porque vos digo que, se a vossa justiça não exceder em muito a dos escribas e fariseus, jamais entrareis no reino dos céus”.
                Então, em que sentido a justiça de Cristo excedeu a dos Escribas? Em primeiro lugar, Jesus não observou somente a mulher, que era uma miserável pecadora, mas ele observou também os fariseus que a acusaram. Eles também eram miseráveis pecadores. Não somente porque eles deixaram o amante da mulher fugir, mas também porque chegaram perto de Jesus com segundas intenções: eles queriam acusá-lo e terminar com seu ministério.
                A resposta de Jesus demonstra a visão mais ampla dele. “Aquele que dentre vós estiver sem pecado seja o primeiro que lhe atire pedra”. Dizendo isso, ele admite que a Lei de Moisés lhes deu o direito de apedrejar tal mulher, mas ao mesmo tempo ele lhes obriga a se examinar antes de fazer isso. O legalista pode facilmente interpretar e aplicar a lei rigorosamente, mas ele deve ser justo e misericordioso.
                Os Fariseus descobriram isso. Eles conheciam a lei; eles ensinavam a lei, mas não a praticavam. Num certo momento Jesus disse às multidões (Mt 23): “Na cadeira de Moisés, se assentaram os Escribas e os Fariseus. Fazei e guardai, pois, tudo quanto eles vos disserem, porém não os imiteis nas suas obras; porque dizem e não fazem”. Então, eles sabem interpretar a lei, mas não sabem praticá-la. Nem o apóstolo Paulo conseguiu isso. Ele se considerou um zelote no meio dos Fariseus, “quanto a justiça que há na lei, irrepreensível”, mas tudo era perda, porque a própria justiça não vale em comparação com a justiça de Cristo.
Ele não conseguiu obter a perfeição, mas se considerou perfeito em Cristo Jesus (Filip 3,12-15);
Imperfeito era Paulo. Imperfeitos eram os colegas dele. Eles ouviram as palavras de Jesus e se examinaram e um por um saíram dali, porque nenhum deles estava sem pecado. Nenhum deles era digno de jogar uma pedra na mulher. A única pessoa que era capaz de fazer isso era Jesus. Mas ele não fez. Erguendo-se Jesus e não vendo a ninguém mais além da mulher, perguntou-lhe: Mulher, onde estão aqueles teus acusadores? Ninguém te condenou? Respondeu ela: Ninguém, Senhor! Então lhe disse Jesus: Nem eu tampouco te condeno: vai e não peques mais!
                Observando isso, uma pessoa poderia pensar: Jesus, de certa maneira, não anulou a lei de Moisés? A resposta é: não! Por um lado, ele não condenou a mulher, mas por outro lado ele disse: não peques mais! Então, ela pecou, sim, mas ele não a condenou. Ela merecia ser castigada, mas ele não o fez. Mais que Moisés está aqui. Jesus chegou para cumprir a lei. Ele chegou para ser o propício dos nossos pecados. Ele é o cordeiro que tira o pecado do mundo (João 1,29). Deus enviou o seu Filho ao mundo, não para que julgasse o mundo, mas para que o mundo fosse salvo por ele (João 3,17); ele foi traspassado pelas nossas transgressões e moído pelas nossas iniquidades; o castigo que nos traz a paz estava sobre ele (Is. 53,5). Jesus é o Salvador. Ele cumpriu a lei de Deus; e, sendo inocente, ele entregou a sua vida na cruz para receber o castigo que nós merecemos. Por causa disso, Ele podia dizer: Nem eu tampouco te condeno. Com essas palavras Jesus não anulou ou atenuou o pecado dela; ele viu o pecado dela e disse: não peques mais! Porém Jesus não a condenou, porque ele ia ser condenado por causa do pecado dela. E por causa dos nossos pecados. Ele ia morrer para que nós pudéssemos viver.
                O sal deve arder, Lutero disse, e com razão. Jesus, sendo o Sal da terra, ‘mordeu’ os Fariseus. A pureza e justiça de Jesus se confrontaram com a impureza e a injustiça dos Fariseus. As palavras de Jesus tocaram a consciência dos Fariseus, mas não o coração. Eles entenderam as palavras de Jesus, mas fugiram e se esconderam. Eles não procuraram Jesus para receber o perdão dos pecados. A mulher ficou, e O Sal da terra a purificou. O Sal serve para purificar e curar. Ela recebeu a remissão dos pecados e a vida. Ela experimentou a justiça de Cristo, que não é igual a um legalismo, mas que aplica a lei com amor e misericórdia de acordo com o espírito da lei. Cristo sabe aplicar a lei com rigor e amor, por causa disso a sua justiça tem sabor! Legalismo é seco e não tem sabor, mas a verdadeira justiça refresca, alegra o coração, é mais desejável que ouro, e mais doce do que o mel e o destilar dos favos!
               

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