A harpa de Davita


                                                              
A Harpa de Davita


Lectori Salutem,

Desta vez, eu quero compartilhar com vocês uma parte das leituras e pesquisas que fiz. Achei bastante interessante e talvez consiga interessar vocês. A leitura me ensinou muito sobre a vida dos judeus ortodoxos e sobre a vida deles de acordo com a Torá. E ao mesmo tempo, eu devia reorganizar os meus arquivos e isso me levou à uma pesquisa da literatura dos últimos cem anos sobre a relação entre a Igreja e Israel.

Essa relação é historicamente complicada. Por um lado, a história de Israel é a nossa história, e por causa disso lemos o Antigo Testamento com muito interesse; o Deus de Abrão, Isaque e Jacó é também o nosso Deus. Então, há muita simpatia para com os Judeus, mas por outro lado não podemos negar os conflitos que houve entre a igreja e os judeus nos primeiros séculos. Os judeus perseguiram os apóstolos e a igreja antiga, e, mais tarde, a igreja perseguiu os Judeus. A história fala de Pogroms: ataques organizados aos Judeus.

Mas lemos também sobre a cooperação entre Judeus e reformados; no século XVII e também no século XX.  A história fala sobre a missão cristã no meio do Judeus e sobre a confusão que surgiu dentro das igrejas depois de 1948, quando o estado Israelense foi fundado. Muitas pessoas acham que isso é um sinal do final dos tempos. Muitas igrejas estão reavaliando a sua relação com Israel. Por um lado existe muita simpatia para com Israel, e por outro lado existem igrejas que se considerem a nova Israel. Elas negam que Deus fez duas alianças: uma com a descendência de Abraão (a linha do sangue) e outra com a igreja de Cristo (a linha da fé); mais tarde eu falarei  mais sobre isso.

Neste momento estou lendo um livro que se chama “A Harpa de Davita”. Esse livro foi escrito por Chaim Potok; um escritor excelente que é um pouco desconhecido aqui no Brasil. Chaim Potok nasceu em 1929 em Nova York e cresceu numa família de Judeus ortodoxos. Ele mesmo estudou na famosa Yeshiva Universidade e se tornou rabino, porém sem congregação. Muitos livros dele contam a história de uma personagem que é um judeu ortodoxo ou um dos judeus ainda mais tradicionais: os chássides.

Os dois primeiros livros dele são um bom exemplo disso. Eles falam sobre a amizade entre dois jovens: Danny Saunders, que é um chásside: filho de um rabino supertradicional; e Reuven Malter, filho de um professor do Talmude, que é considerado liberal, porque aceita a crítica textual do Antigo Testamento. Ambos são ‘craques’ na interpretação da Tora e lendo os livros você começa a conhecer a vida ortodoxa dos Judeus. O primeiro livro se chama “The Chosen” (- “O Escolhido”) e o segundo livro “The Promise” (= “A promessa”); Já li os primeiros dois livros e devo admitir: adorei!

O terceiro livro é um pouco diferente, porque descreve a vida de uma menina de mais ou menos oito anos, que se chama Ilana Davita. Os pais de Davita eram religiosos, mas se tornaram comunistas. O pai era católico e a mão era chásside. Eles vivam nos anos trintas em Nova York. O tempo é tumultuoso, porque o comunismo era observado em América com muita suspeita, e por outro lado surge o Fascismo em Europa, tanto na Alemanha como também na Espanha; Especialmente Espanha recebe muita atenção, porque ali houve uma guerra civil nos anos trintas: Os comunistas lutaram contra os Fascistas de Franco e o assunto recebe muita atenção na família de Davita, porque o pai é jornalista e a mãe tem um papel importante no partido comunista em Nova York.

Então, a pequena Davita cresce nessa situação de controvérsias e começa a conhecer também alguns parentes da mãe que são chássides e a irmã do pai, que é uma católica convicta. Então, enquanto os pais não são religiosos e não querem saber de nada disso, a pequena Davita é atraída pela adoração dos parentes: por um lado a música e os cânticos da sinagoga e por outro lado a devoção e as orações da tia, que visita de vez em quando a casa de Davita.

Em todos os livros achei interessante a questão cultural. Já escrevi mais sobre isso no meu Blog. Como deve ser o papel do crente no contexto em que ele vive? “Seja o Sal da terra!”, disse Jesus; então, não podemos nos esconder e viver com uma bíblia num esconderijo, afastados do mundo em redor de nós. Os chássides vivem assim. O estudo da Torá é tudo e serve para ter uma vida santa perante o Adonai. Isso é um lado que Davita observa; o outro lado é o da tia, que é enfermeira católica; ela viaja para todos os lugares onde ela pode ajudar. Os pais são comunistas e são muito ativos em favor dos trabalhadores, que não tinham tantos direitos nos anos trintas como hoje em dia; o pai é jornalista e escreve artigos em favor do Comunismo e avisando contra as ideias da Fascismo. Ambos bem engajados na política local e mundial. Mas isso termina dramaticamente. O pai foi para Espanha como jornalista de guerra, para escrever sobre a guerra civil que acontecia ali, e ele perde a sua vida durante um bombardeio na cidade de Guérnica. E a mãe ficou desiludida e perdeu a ‘fé’ no comunismo, quando ouviu que Stalin e Hitler fizeram um pacto no início da segunda guerra mundial.

Durante a narrativa, podemos observar que a pequena Davita não gosta do comunismo dos pais e é atraída pela vida dos parentes da mãe, que são judeus ortodoxos. Num certo momento ela vai também para a escola judaica e começa a aprender hebraico e estudar o talmude. Ela é super inteligente e tem uma fantasia boa. Fica claro que ela é interessada na religião dos parentes do lado da mãe e na religião católica do lado do pai. A questão é onde ela vai chegar. Não vou dizer, porque é melhor ler o livro. É bem escrito! Sempre admiro um escritor ou escritora que consegue escrever um livro com uma personagem oposta a si mesmo. Como aqui, Potok escreveu tudo do ponto de vista de uma menina de mais ou menos oito anos.  Pode ser que Potok transformou muitas experiências dele (ele nasceu em 1929 e vivia como menino na mesma época), mas é excelente como ele consegue combinar isso com uma "vida feminina".

Ainda algo para explicar o título: a Harpa de Davita se refere a uma harpa que está pendurada na porta. A harpa tem bolinhas que tocam as cordas e assim produz uma certa música agradável. A música é especial e está ligada ao apartamento onde Davita mora e à presença simpática de Davita. Alguém chamou a música de a “música da inocência”. A música é especial para Davita, porque ela vive num mundo onde há muito barulho de gritos, discussões, conflitos, guerras e bombardeios.

Espero que vocês comecem a se interessar por esse autor. Porém, será difícil encontrar um livro dele em português. Procurei por muito tempo e finalmente consegui um outro livro dele que é famoso também: O meu nome é Asjer Lev. Asjer Lev cresce também numa família de Judeus ortodoxos. Ele tem o dom de desenhar e sente um chamado para ser artista, mas isso causa um conflito na família, especialmente com seu pai. Mais uma vez a questão entre a religião e o contexto cultural; a questão do isolamento ou da adaptação ao contexto cultural. Uma questão que não somente os Judeus ortodoxos conhecem, mas também os reformados tradicionais.



Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Três ideias que explicam a relação entre Israel e a Igreja - Parte 2

Só salmos no culto da igreja? - Parte 3

Adolf von Harnack: O que é Cristianismo? - Parte 1